31 julho 2007

Monólogo dos cachorrinhos

Há o monólogo, interminável e inconstante, uma eterna discussão sobre o nada que almeja ser algo e que, aos poucos vai tomando forma. Coisas ficam para trás e já não mais lhe pertencem: pelo menos, não como gostariam de pertencer. E a conversa continua, como se fosse uma oração. Há os agradecimentos e há algum receio de pedir por algo novo: tudo é muito novo. Escuta-se os cachorrinhos à toda voz, latindo um latido desafinado e fraco, mas que é forte por ser, até então, o máximo que podem alcançar. Observa-se pessoas brincando, gente que só tem tamanho e feições adultas, mas que continuam crianças, atirando-se água no banheiro ao escovar os dentes: talvez como a cadela que é mãe e ainda se julga filhote. Não se cresce do dia para a noite. O monólogo que cerca, acompanha e medita todo o crescimento é eterno, assim como o proprio crescimento. Há quem desista de crescer e de evoluir. Porque sim, é confortável permanecer onde se está e cobrir-se com mil cobertores até a cabeça, limitando a respiração ao máximo de ar que pode passar pelos poros da carapuça que envolve todo o corpo. Porque é fácil também agradecer por tudo que se tem e julgar que não se merece mais do que se tem. Pelo menos, é garantida a proteção contra o sentimento de achar que o mundo todo está aquém daquilo que merecemos. Somos parte do mundo e, como tal, estamos todos nivelados à mercê da natureza e das energias superiores e, provavelmente, toda evolução que alcançamos sirva apenas para que vejamos alguma graça na criança eterna que está sempre gritando à sua máxima voz, buscando alguém que a ouça e tentando ouvir a si mesma, brincando por aí com outras crianças, reconhecendo-as e, acima de tudo, para encontrar algum assunto para o longo monólogo, que seria insuportável sem alguma variação, ainda que, no fundo, a conversa seja sempre a mesma.

2 Comentários:

Blogger Anderson Lucarezi; disse...

'gradecido, caríssimo.
por acaso vc é o fernando cabral?

sobre esse texto : a visão da pessoa com o capuz querendo evitar a entrada da novidade e da evolução é algo que mexeu comigo, me fez repensar (ou lembrar) que o tempo deixa saudades.

sobre o texto de baixo : traduções são algo que eu invejo muito! hahahahaha!

saudações,

1/8/07 00:00  
Blogger Petê Rissatti; disse...

Fernando,
Esse fim de semana todinho falei sobre a criança interior com várias pessoas. Essa criança deve ser mais que respeita, deve ser obedecida. Ela guia nossos impulsos mais puros e originais, por isso é fundamental que a voz dela não se cale.
Assim eu vejo, como diriam os alemães.
Grande abraço

5/8/07 23:21  

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