28 junho 2008

Carta àquele que espera

Prezado homem, capaz de sonhar,
gostaria de dizer-lhe aqui algumas poucas palavras, porque sei o quanto lhe é sofrido assistir o grande filme da vida enquanto cuida de suas futilidades com todo o esmero. Ah, quão grandes lhe parecem todos esses sofrimentos e toda a tristeza ao ver que quase nada sai como você pensou... Você perdeu muito do seu tempo sonhando, imaginou que as coisas pudessem ter sido transportadas da sua realidade para a realidade dos outros. Você sempre soube que isso é algo impossível de se fazer e que não há mudanças que se processem do lado de fora sem que antes elas aconteçam aí dentro...
Meu querido, o tempo é o melhor remédio para todas as questões: se não cura, medica, vai aplicando doses leves de um sedativo que torna suportável o caminho até os primeiros sinais de cura...e estes vêm sem nenhum aviso, sem nenhum preparo. Não estamos preparados para a cura.
Mas que é a cura? Cura seria livrar-se daquilo que causa algum mal, ou seria modificar aquilo que faz mal de maneira a obrigar esse aquilo a fazer bem? Ficam aqui duas perguntas que eu, infelizmente, tonto que sou, não saberia lhe responder.
Eu gostaria imensamente de poder dizer que você está perfeitamente curado do que lhe afligia com maior força, entretanto, por não saber o que seria a cura completa, atrevo-me apenas a dizer-lhe isso: sossegue seu espírito, rapaz! Você está medicado e a parte mais difícil já passou. Você já não é mais dependente dos remédios visuais e nem da ansiedade em transformar o mundo naquilo que você gostaria que ele fosse. Você precisa esperar o total efeito da sua medicação: veja que aquilo que você esperava incessantemente já veio e está bem aí ao seu lado. Não está completo, porque talvez ainda lhe falte a certeza que estraga todas as coisas, mas você já tem grande parte do que queria alcançar, percebeu? O que era sonho, veio sem dar aviso para a sua realidade. É aquela história de esquecer o ovo e deixá-lo ir... um dia, esquecido, ele voltará à sua presença completamente diferente e, então, você poderá ter o diagnóstico mais terrível e decisivo de sua vida: você descobrirá nesse momento que o ama, ou que deixou de amá-lo, ou que nunca o amou. Mas o que fazer desse diagnóstico? Infelizmente, também não sei lhe responder, caro amigo. Tente ir levando sua vida com suas novas descobertas e sentimentos... continue deixando o ovo de lado, mas não o trate como se ele estivesse à parte: ele é, foi e será sempre uma parte importante daquilo que nos atrevemos a chamar: você.
Um conselho que eu talvez poderia lhe dar... Evite a sinceridade total, nem tudo precisa ser dito: algumas atitudes, você sabe bem, falam mais do que qualquer "eu te amo" dito da boca para fora por aí. Você não precisa ouvir isso claramente: isso sempre é dito em coisas que a gente quase nunca vê. Deixe tudo subentendido e subentenda também. Não sofra e evite fazer sofrer.
Viva e deixe viver... cada um terá exatamente aquilo que lhe cabe.
Seja feliz e se cuide,
Eu.