24 março 2007

Enquanto isso...

Enquanto nasce o sol, há um desconforto nas pupilas que se adaptam e aos poucos se preparam para ver a luz. Fica para tras a cegueira de uma noite escura e vem o dia. E vem o dia. Já não há mais a possibilidade doconforto, este que só é permitido àqueles que se entregam ao mundo tal como ele é e que, portanto, já estão definitivamente cegos à espera de um braço, um cão guia, alguém que os ajude a sobreviver na escuridão, alguém que lhes ensine os degraus, que os proteja das quinas, que os freie à beira de semáforos fechados. Estes cegos precisam de alguém que possa contribuir com sua fragilidade quase infantil. Alguém que contribua, que conforte. Felizes são aqueles que não têm conforto, porque a paz de espirito é deveras confortável e estagnante. A inquietação é necessária, assim como é necessário retirar as vendas e enfrentar a luz com as pupilas dilatadas - é importante lembrar que a luz em excesso é tão prejudicial quanto a cegueira: o mau uso de uma arma pode matar aquele que a opera. - É permitido o desconforto para que o contato com a luz faça da busca do conforto um objetivo constante, mas o importante é nunca encontrá-lo, é deixar que ele se esconda diante do olhos para sempre poder procurá-lo, afinal, aqueles que se permitem o desconforto sabem exatamente onde está oconforto e, por isso mesmo, é que não se deixam contaminar por ele. O conforto é pobre. E então as pessoas um dia se dão conta de que o melhor é a condição masoquista à qual se expõem em algumas fases da vida. É preciso desconfortar-se e encontrar algum prazer no desconforto, libertar-se das amarras e das vendas. Só é verdadeiramente livre aquele que pode caminhar e tropeçar, cair e se levantar, coçar os olhos incomodados pela luz, cair, rastejar, ralar os joelhos, levantar e tocar seu caminho desconfortavelmente livre, enquanto nasce o sol.

18 março 2007

Do fundo do baú

Tenho a convicção de que sou outro e de que serei outro ainda mais diferente em alguns anos. Hoje, consegui fazer as pazes com o Blogger e cá estou postando. Pensei em colocar aqui algo antigo, que eu tivesse escrito na era pré-faculdade e meu susto foi ter visto um punhado de textos que eu jogaria fora sem dó porque são muito ruins e refletem uma mente doentia em processo de início de mudança, mergulhado no caos.
De tudo isso, restam uns quatro ou cinco que ainda me trazem alguma coisa boa por tê-los escrito, apesar de achá-los pobres tb. Transcreverei abaixo um de 21/05/2003... foi escrito numa época bacana em que havia bastantes blogs de qualidade e este texto especifico foi escrito para inaugurar um blog que eu tinha com alguns amigos, dos quais só tenho contato com uma.

Não conheço o caminho. Não sou dono do destino. Não me importam formas alheias de pensamento.Continuo sendo eu. Continuo pensando e pensando e pensando. Continuo existindo e tendo opinião própria. Continuo falando.Continuo escrevendo.Continuo pensando,existindo,falando e escrevendo. De acordo com meu ponto de vista.Sobre o assunto que eu quiser. Onde eu quiser. Como eu quiser. Não conheço o caminho. Não sou dono do fim. Não me importa o quão fútil pode parecer meu assunto. Não me importa o quão importante pode parecer meu assunto.Você também não se importa com a importância que ele pode ter para mim.Igual às moscas,rondando material pútrefo diante do nosso ponto de vista. Egoísta. Insensível. Mediocre.Tão medíocre quanto aqueles que julgaram medíocres outras formas de civilizações que não as suas,no passado: somos todos medíocres. Tendemos a pensar sempre que o que não nos importa deve ser indiferente a outrem como nos parece. Nunca paramos para pensar que o que é pútrefo para nós é a vida para outrem. Antes de torcer o nariz para uma nuvem de moscas sobre um punhado de esterco,pense que ela não vê aquilo como esterco. Pense que ela não compartilha de sua visão medíocre. Pense que aquilo é a razão da vida dela. Não conheço o caminho. Não me recuso a enxergar o destino dos medíocres. O vazio. A solidão. O local onde nada restarão além de suas verdades,seus pré-conceitos. Sua vida. Um grande vazio. A escuridão. Nada além de você e algumas moscas aguardando seu apodrecimento total para um completo banquete com as bactérias e outros seres tão medíocres quanto. Para que, quando você perceber, nada mais restará de sua superioridade. Nada. Nada além das moscas na casa.